É neste momento que cai a ficha da gente e percebemos que a carreira está apenas começando…
Centro de Informações
Comecei no Banco Nacional em Maio/1991 (o banco que patrocinava o Ayrton Senna) e fui trabalhar na área de Centro de Informações, o nome pode soar estranho para muitos de vocês, mas diria que essa área foi os primórdios do BI (Business Intelligence). Em resumo, coletávamos dados de várias áreas do banco para montar bases mais estratégicas para apoiar as decisões nas áreas de negócios. Trabalhava em Alphaville em uma Superintendência de aproximadamente 50 a 60 pessoas, onde havia apenas uma corajosa mulher que já estava lá há mais tempo que eu. De cara estranhei essa convivência com muitos homens, pois chegava um momento em que eles esqueciam que haviam mulheres por perto e falavam besteiras sem tamanho. Eu fingia ser um 2 de paus como se não tivesse escutado e prezava a política da boa convivência. Nunca fui menosprezada pelos meus colegas por ser mulher, mas eu tinha sonhos de fazer outras coisas além do trabalho e isso não me tornava uma workaholic.
O desafio era grande para uma recém formada que apenas tinha estudado programação ou desenvolvimento de sistemas. Nunca tinha pensado em visão estratégica para dados e às vezes eu achava que meu chefe falava grego, não conseguia entender o que de fato ele queria. Ele sim era workaholic e ficava até tarde no banco, na contrapartida eu saía pontualmente às 17:30 (de segunda a quinta), pegava o ônibus do banco e vinha estudar inglês na região da consolação. Indiretamente havia uma pressão e um clima ruim no final do expediente, parecia que eu estava “cabulando” a aula, quando no fundo eu estava saindo no horário para continuar estudando. Meu chefe só ficava feliz quando eu estava de férias, pois estendia meu horário até 19 horas. Quando retomava as aulas o clima péssimo voltava.
Com o passar do tempo essa situação me fez somatizar uma tendinite nos 2 braços. Era difícil trabalhar, sentia muitas dores e para vocês terem uma ideia cheguei a ir para o banco várias vezes, com gesso no braço (na época não tinha aquelas luvas de imobilização) e ficava explicando para uma outra pessoa como ela deveria fazer o meu trabalho. Foi nesse momento que eu contei com o apoio de 2 mulheres, precursoras a mim na área de tecnologia e que fizeram muita diferença na minha vida: Thereza Leal (que faleceu em 2013) tinha uma qualidade nata, falava de negócios e de TI e dava baile em muito diretor, posteriormente passou a ser minha mentora. Martha Gagliano (atualmente na Vale do Rio Doce) que além de trabalhar com desenvolvimento de sistemas, tinha uma visão estratégica da informação e preparava todo material que a Thereza utilizava para apresentar a performance do banco aos diretores e as áreas de negócios. Foi graças à Thereza que mudei de área. Ela sabia do trabalho que fazia com a Martha e me indicou para o time de qualidade.
Nova área: Qualidade – VP Empresas
No início de 1994 fui para a VP de empresas na Av Paulista. Uma mudança da água para o vinho! Primeiro porque eu teria um novo chefe e estava abandonando a TI para trabalhar em uma área de Negócios onde passaria a entender como funcionava a força de vendas do banco. Meu novo chefe era um gestor nato, Ildeu Lau, me acolheu super bem ajudando a resgatar a confiança no meu trabalho e acordamos que eu deveria fazer fisioterapia regularmente, próximo ao banco, para me recuperar da tendinite. Naquele ano eu finalizava o inglês e o Ildeu sugeriu que eu fizesse uma pós-graduação em Marketing ou Administração por conta das atividades que realizava na área. Comentei a ele que não tinha como fazer uma pós pois o meu curso de tecnologia não era reconhecido pelo MEC como graduação. Sobrava para mim fazer um curso complementar, que não me despertava interesse ou voltaria para a escola e fazer uma nova faculdade. Naquela época eu já trabalhava com windows 3.1, o novíssimo pacote office lançado pela Microsoft e softwares gráficos como Coreldraw, além é claro de continuar a trabalhar com análise de dados só que dessa vez com foco totalmente no estratégico (foi nessa área que passei a entender o discurso do meu chefe anterior).
Estudar Desenho Industrial
Apresentei para o Ildeu a proposta de estudar Desenho Industrial com foco em Design Gráfico, um curso dentro da faculdade de Comunicação e Artes no Mackenzie. Ele topou e disse: se você passar, peço para o RH uma bolsa de 50% para sua faculdade! Quase perdi o dia prova, passei e fiz minha matrícula na segunda chamada.
O mercado estava aquecido para softwares gráficos e além dos trabalhos que eu fazia dentro banco, comprei um computador para explorar mais essas novas ferramentas. Para quem sempre foi apaixonada por tecnologia, poderia ser maluco estudar design, ia desviar a minha carreira técnica para o lado de humanas. Como me posicionaria no mercado? Sinceramente, apenas pensei em uma realização pessoal, se tinha que voltar aos estudos, que fosse por algo que eu estava muito a fim de fazer.
E vocês podem estar pensando: como surgiu esse gosto pelo design? Desde pequena sempre gostei de televisão e acompanhava de perto a evolução que começou na Rede Globo, em 1975. Primeiro foi a logomarca, depois os cenários, as aberturas de novelas e telejornais, tudo isso acontecia por causa da computação gráfica liderada por Hans Donner.
Comecei o curso em 1995 e nunca estudei com tanto gosto e prazer, não tinha sono, não me sentia cansada, refazia meus trabalhos até ter o resultado que eu queria ou então ficavam prontos de primeira. Explorei tudo que podia na faculdade e trazia novidades para o trabalho. Uma sinergia que me deixou tão feliz, mas tão feliz que até a tendinite sarou. Em 1995 foi também o ano que descobri a internet, na época os buscadores mais famosos eram o Cadê, Yahoo e Altavista. Em 1996 a revolução nas buscas ia mudar com o surgimento do Google.
Qualquer pessoa que entra na faculdade só vai pensar no trabalho de conclusão de curso (TCC) lá nos 45 do segundo tempo, ou seja, no segundo semestre do 4o. ano. Eu entrei na faculdade já sabendo o que queria fazer: produzir uma vinheta de televisão. Na época que ingressei soube de um aluno que tinha ido no programa do Jô Soares para apresentar seu trabalho de graduação. Coloquei isso como meta para mim e decidi já no primeiro semestre da faculdade que meu TCC seria uma vinheta de abertura e proposta de um novo cenário para o programa do Jô 11 e meia que era no SBT.
Venda do Nacional para o Unibanco
Em novembro de 1995 fomos notificados pela TV que o banco tinha sido comprado pelo Unibanco. Meu chefe logo tratou de me realocar para outra equipe, assim não correria o risco de perder o emprego e no fundo ele sabia que a área onde estávamos seria descartada. Em meados do segundo semestre de 1996 fui realocada para a Controladoria no Unibanco, levando comigo o conhecimento das bases estratégicas do Nacional que seriam utilizadas no processo da fusão. A equipe, na sua maioria, era muito conservadora e o pessoal definitivamente não entendia como alguém de TI estudava Design. Embora meu gerente não abria muito o jogo, eu percebia que não estava entre os profissionais com o melhor curriculum.
Durante o período que fiquei na controladoria houve a oportunidade de trabalhar com Microsoft Access e migrar todo processo de análise de performance das agências para essa plataforma. Eu topei sem saber que aquilo era um peneira de quem ficava e de quem seria demitido. O meu aceite mostrou que estava aberta ao novo e ganhei uns pontos com a minha hierarquia, mas sempre era vista como um peixe fora d’água, aquela que desenhava e pintava casinha na faculdade. Eu andava com pastas gigantes, réguas, tintas, pincéis, papéis coloridos…nada a ver com a controladoria.
Meus 15 minutos de fama!
Chegou o ano de 1998, o último da faculdade e a reta final do meu TCC. Definitivamente o universo conspirou a meu favor: consegui visitar a produção do programa do Jô, fiz contato com a Rede Globo e o próprio Hans autorizou cópia de materiais que seriam úteis para a montagem do meu trabalho e minha orientadora me apresentou algumas pessoas que me levaram a contatos em Los Angeles para visitar a empresa de James Cameron, a Digital Domain responsável pelos efeitos especiais em Titanic.
Para fechar com chave de ouro, o meu contato em Los Angeles me apresentou um dos animadores de Toy Story, Anthony Lamolinara. Para quem queria apenas fazer uma vinheta, eu tinha chegado muito longe e em uma época em que não existia rede social, o Orkut só seria lançado em 2004. A lei da ação e reação de fato existe.
Foi um período puxado, pois tinha o trabalho, as aulas e a produção de vinheta e cenário. Tudo deu certo, e em 07 de dezembro de 1998 apresentei o TCC na faculdade com direito a nota 10. Além da apresentação, fui entrevistada pela TV Mackenzie que apresentaria o meu projeto no Canal Universitário. Em 10 de dezembro de 1998 faltei no banco na parte da manhã para levar uma cópia do trabalho no SBT em agradecimento pelo suporte que me ofereceram. Aquele era o último dia de gravação e fui recebida por Max Nunes (amigo e produtor do Jô) e Willem van Weerelt (diretor do programa). Eles adoraram e pediram para eu deixar o material lá e pegar no dia seguinte. Decidi esperar eles mostrarem para o Jô, faltaria o dia todo no banco e pegava meu material no final do dia. Foi a decisão mais sábia da minha vida. Jô gostou e disse: Vou mostrar o trabalho dessa moça no programa de hoje.
Aquele dia foi um divisor de águas na minha vida, afinal o meu trabalho tinha sido reconhecido e um sonho realizado. O programa foi ao ar naquela noite e quando eu cheguei no banco no dia seguinte nem precisei explicar minha ausência, muita gente no meu andar tinha visto o programa e veio me parabenizar, finalmente as pessoas entenderam o que eu de fato fazia na faculdade. Depois de ter a oportunidade de conhecer o Jô, pude também conhecer e agradecer pessoalmente ao Hans Donner por colaborar comigo, ele foi realmente uma pessoa muito generosa.
Trabalhar com Internet
Depois da repercussão desse trabalho surge a oportunidade de trabalhar na Internet do Unibanco em 1999. Ia conciliar meus conhecimentos de Design e TI em uma única área. Mas aqui a vida não era fácil, um time de egos inflados pois a área tinha muito prestígio por se reportar diretamente ao presidente do banco: Pedro Moreira Salles, aí vocês imaginam como as pessoas se sentiam. Todo mundo queria aparecer e se você fizesse algo que invadia um pouquinho o espaço do outro era tenso.
Meu chefe não queria que eu desse um passo sem falar com ele. Houve um projeto no qual eu trabalhava, em que pela primeira vez, íamos usar uma ferramenta para publicação dinâmica de conteúdo (coisa normal hoje em dia), meu diretor me procurou pois queria alguém para apresentar a solução ao Pedro, meu gerente não estava na área e ele decidiu me levar com ele. Confesso que fiquei nervosa pois nunca imaginaria apresentar algo para o presidente do banco. Meu chefe ficou louco quando voltei da apresentação, disse que eu deveria ter recusado o pedido do diretor e ter procurado ele para ir no meu lugar.
Os egos inflados levaram muita gente para o mercado, as ofertas de trabalho eram inúmeras, gerando mudanças na hierarquia. Foi por causa dessas mudanças que pela primeira vez que teria uma gestora que fez muita diferença na minha vida: Danielle Pimenta. Dani era superintendente, pulso firme mas uma pessoa generosa. Em seu discurso de chegada ela queria que a gente pensasse na nossa carreira, o que eu de fato queríamos fazer. Dani me entregou inúmeros desafios, das mais diferentes áreas e produtos do banco, fui entender de processos, marketing, segurança, relações com investidores, comportamento do cliente e até analytics. A ideia era me preparar para ser uma futura gerente na área. Infelizmente Dani saiu por causa da licença maternidade e aí vivemos momentos de constantes mudanças de gestores, haviam aqueles que se sentiam ameaçados e te entregava desafios insignificantes, outros se descontrolavam e gritavam com a equipe na frente de todos (eu mesma fui vítima disso), outros praticavam um assédio velado além do favoritismo com alguns funcionários. Tivemos que reportar esses acontecimentos para o RH que desligou algumas pessoas e transferiu outras.
Meus planos de virar um gerente foi minando até que a coisa se voltou contra mim, achavam que eu tinha um perfil técnico para continuar na internet e queriam me demitir (soube disso muitos anos depois), eu que tinha uma experiência grande na área, agora achavam que eu não servia mais.
Voltando para a TI
Surgiu o convite para eu voltar à tecnologia em 2004, fui trabalhar na equipe da Margarida Afonso que era gerente da TI para a internet. Agora os tempos eram outros e o número de mulheres na tecnologia era muito grande desde que saí. Guida foi uma excelente gestora, aprendi muito com ela e o meu perfil híbrido (TI e Negócios), aliado com a minha comunicação, ajudava o nosso time a ter sucesso com os projetos. Nós éramos de fato analistas de sistemas e boa parte do desenvolvimento era todo terceirizado. As chances aqui de virar um coordenador eram mais remotas para mim, afinal eu tinha vindo de negócios e já haviam pessoas com mais tempo de casa que eu. 4 anos depois mais uma grande fusão, agora com o Itaú.
Itaú Unibanco – o maior banco privado do Brasil.
Eu sabia que essa fase não seria fácil pois o Unibanco tinha uma TI mais enxuta e boa parte terceirizada e o Itaú fazia internamente a maior parte das atividades. Passada a fase de adaptação eu continuava na TI porém as exigências de ter um conhecimento técnico foi aumentando ano após ano.
Em 2010 decidi fazer um MBA em Gestão Estratégica e Econômica de Negócios na FGV, uma experiência excelente pois escolhi o que de fato queria estudar, como já tinha feito isso uma vez, sabia que a sala de aula seria um momento prazeroso e foi. Ao encerrar o curso consegui me posicionar no banco em atividades relacionadas com web analytics e novamente toda minha bagagem de conhecimento em dados meu ajudou, era responsável pelo Google Analytics e atendia as áreas de canais, projetos e marketing fazendo inúmeras análises, construindo dashboards e montando planejamento de métricas para novos projetos. A cada dia meus pares eram muitos técnicos e eu mais voltada ao negócio, nos últimos anos cheguei a ouvir da hierarquia que se eu insistisse muito em seguir com o assunto de analytics eu seria demitida, deveria me tornar um profissional mais técnico e deixar as métricas de lado. Não deixei o assunto e não me arrependo, me demitiram em janeiro de 2016 em um momento em que eu tinha acabado de montar do planejamento de métricas para o novo internet banking e aplicativos mobile. Aquilo era muito mais realização pessoal indo contra a gestão.
Por um lado foi um alívio de me libertar de tanta pressão e por outro eu não sabia por onde começaria e me reinventar.
Carreira Solo e Dr. Métricas
Os primeiros 6 meses foram para arrumar as idéias, fiz uma extensão em Mobile Marketing na FGV além de receber uma assessoria em outplacement pago pelo banco, encerrei o processo com a idéia de montar minha própria consultoria na área de analytics e recebi o convite da Amyris Fernandes da FGV, para dar aulas sobre analytics no PEC da FGV, ou seja virei professora e me especializei em analytics.
A vida de empreendedora exige disciplina e temos que fazer de tudo um pouco, por isso decidi também participar de um hackathon e relatei essa experiência em outro post que fiz aqui no linkedin, foi genial. Tudo que aprendi em 28 anos de carreira, mais a minha formação são ferramentas que utilizo no meu dia a dia.
Ano passado fiz 2 coisas que foram de grande valia. Um curso de comunicação de alta performance com o Maurício de Freitas que me preparou para ter um melhor desempenho ao falar em público e um processo de Coach com o Calebe Luo que em apresentou a metodologia da Gallup, o CliftonStrengths, que identifica seus pontos fortes. E curiosamente, os meus 5 talentos: Carisma, Estudioso, Comunicação, Realização e Estratégico. Quando eu vi isso fiquei impressionada, todos os melhores momentos na minha vida eu estava justamente aplicando esses talentos. O contato com pessoas, estudar coisas novas, me comunicar bem, ir atrás das realizações e ter uma visão estratégica sobre as coisas.
Minha carreira hoje é ajudar empresas a tomarem decisões estratégicas a partir do analytics além de palestrar e lecionar sobre o assunto. Os caminhos são outros, não sei o que me aguarda amanhã mas sou dona do meu próprio destino e estou feliz. Sou grata a todos que passaram pela minha jornada direta ou indiretamente. Até mesmo os maus momentos agregaram e nos ensinam o que não devemos fazer.
Espero ter ajudado outras pessoas a irem em buscas de suas jornadas. A minha, está apenas começando!
Leiam o primeiro post neste neste link: Empoderamento Feminino – Parte 1
Leiam o primeiro post neste neste link: Empoderamento Feminino – Parte 2